domingo, 24 de novembro de 2013

Olhos de Farol

Esses dias conheci um menino diferente, um garoto com olhos de farol. Ele trazia nos globos oculares luz pura, radiante e infinita. As pupilas emitiam luminosidade aos cantos mais escuros  da Terra, ou onde a luz pudesse alcançar.

Soube que ele nasceu com este dom, uma característica notada pelos seus, mas que não foi visto como um problema. Afinal, era bom ver luz a todo instante no olhar daquela criança. A preocupação inicial era se ele enxergaria o mundo como os demais e, após um tempo, os seus perceberam que o menino via aparentemente como qualquer pessoa.

O menino crescia e conhecia tudo ao seu redor, se encantando a cada dia, observando belezas, sutilezas e peculiaridades que ninguém mais via. O chão, as flores, as estrelas, os animais, os rostos e sorrisos, e toda obra do criador. Obra que, segundo ele, era a perfeição.

Ele passava seus dias contemplando o belo jardim onde vivia com os seus, protegido por fortes muros e, principalmente, pela companhia das pessoas de alma leve. Porém, seguindo os impulsos naturais da humanidade, buscou conhecimento além do horizonte por meio de vivências e processos empíricos. O menino com olhos de farol sentia que precisava de algo além daqueles muros, o que pudesse completar ou ampliar sua alma.

Na calada da noite, saiu sorrateiramente em busca do novo, rompendo a proteção dos muros. Em sua caminhada conheceu pessoas coloridas, cintilantes, mas em sua maioria apagadas, desenhadas pela vida com tons de marrom e cinza. Experimentou sensações, gostos, horizontes, mas também dissabores e tristezas. 

Decidido a regressar, a caminho de volta, ele deparou-se com um ser luminoso. Alguém de luz branca, quente e tênue. Sem dúvida, uma beleza única, luscofuscolar. O menino com olhos de farol se aproximou, tocou, e se permitiu ao maior e mais doloroso aprendizado do homem: a prática do amor. 

As últimas barreiras haviam sido quebradas, e o menino mergulhou em um turbilhão de sensações, das mais divinas, passando pelas carnais, até a animais. A intensidade do sentir, o prendia de forma magnética aquele ser. Sim, ele estava apaixonado! Uma intensidade que exigia mais do que ele podia dar. Aos poucos, ele enxergava menos beleza naquele ser. Passada a primavera incipiente, agora chegara o inverno, fazendo cair cada mascará como pétalas secas, mostrando a pouca afinidade entre os olhos de farol e aquele que ele resolveu chamar de luscofusco. 

Confuso, com o coração perdido em um mar de incertezas, e o olhar ofuscado, ele regressou para os seus. Bem recebido, ele foi remediado com poderosas ervas e orações feitas pelos conselheiros de sua terra. Recuperado, e disposto a entender sua vivência, buscou as orientações de um oráculo que enxergava com os olhos da alma.

O menino relatou toda sua caminhada, recordando detalhes, que o ajudaram a entender o que havia acontecido. Ao final, o oráculo sorriu e disse: busque o espelho e você entenderá. Ainda sem compreender, ele toma em suas mãos a lâmina refletiva e vê o brilho de seus olhos iluminando o ambiente. O oráculo então concluiu: toda luz e beleza que você enxergava e estava em você, era sua luz que iluminava aquele ser, o tornando luscofusco.

Tudo fez sentido, e ele decidiu caminhar sozinho em busca de outros faróis, para que juntos pudessem levar de forma abnegada luz a lugares obscuros.

Silas Macedo

domingo, 17 de novembro de 2013

Sábio Conselho

Dizem que um sábio conselho não tem preço... 

Já faz algum tempo que recebi uma lição de um velho amigo. Um ensinamento que certamente levarei para a vida toda. Há quase cinco anos, meu avó me convidou para fazer uma viagem religiosa com todos meus familiares para o santuário de Aparecida no Norte.

Ele, muito religioso e devoto de Nossa Senhora Aparecida, fretou um ônibus, convocou todos os filhos e netos com o intuito de celebrar a fé e a vida. Foi uma viagem marcante, divertida e única, com direito a missa na catedral, passeio pela basílica e almoço em família.

No final da tarde, todos sentamos para descansar e tentar se proteger do sol escaldante daquela região. Meu avó, discretamente, chamou cada um dos familiares e disse algo importante, um conselho, que poderia passar despercebido ou não, dependendo da atenção e percepção de cada um.

Aos netos chamou um a um, deu afago, uma risada e um conselho. Anos depois soube o que foi dito a alguns de meus primos. De forma quase mediúnica e intuitiva, ele falou como seria a vida de cada um de nós.

Quanto a mim, ele me questionou: "Meu filho o que é bom da vida?"

Sem entender o propósito da pergunta, pensei em um milhão de possibilidades, sem levar a sério o questionamento. Ele insistiu e eu respondi: "Sei lá vô!" Foi quando fui surpreendido pela sábia resposta: "O amor! O amor meu filho, seja com uma mulher, um homem, o importante é amar."

Admito que fiquei atônito, sem reação, vislumbrando a profundidade do ensinamento dado por aquele homem simples, aparentemente não conhecedor de grandes mistérios, sem nenhuma formação acadêmica, e que sempre esteve ao meu lado durante toda a sua caminhada terrena. 

Em primeiro momento questionei o motivo daquela afirmação, depois por qual motivo ele estava me falando aquilo e, por fim, por que naquele momento? As respostas vieram a mente de forma clara e tranquila. Em sua sabedoria ele enxergava em mim mais do que eu mesmo pudesse vislumbrar, certamente por minha sexualidade e forma de amar diferente. Percebi que ele deu um ensinamento e lampejos de luz para guiar minha caminhada.

Sem entender porque naquele momento, disse a ele que havia entendido o recado e a todo custo colocaria em prática aquele ensinamento. Terminei a conversa rindo. Recordo claramente que voltamos em paz daquela viagem. No dia seguinte entendi o motivo de ter ouvido tal ensinamento naquele momento, meu avô desencarnou no dia seguinte.

Já tive inúmeras divagações sobre esse importante episódio, entre elas; que a sabedoria vem da alma e das vivências que temos em todas as nossas encarnações, fato que explica a facilidade que um homem velho, nordestino, e sem instrução, aceitar todas as formas de amor.  Sinceramente espero que o exemplo dele seja seguido por outros. Divaguei ainda sobre como pessoas de fé - mais espiritualizadas - sentem o que devem fazer na caminhada terrestre e, principalmente, sentem quando vão desencarnar.

Fato que ele partiu e deixou plantado em mim a principal lição. Que o mais importa na vida é o amor! Por isso, creio que devemos cultivá-lo, multiplicá-lo e compartilhá-lo. 

Termino este texto com a lembrança do avó materno que ficava orgulhoso ao ver meus desenhos mirabolantes na infância e no fim de sua vida era chamado por mim e minha mãe de Gandalf - o mago cinzento descrito por Tolkien em "O Senhor dos Anéis"- porque ambos tinham o mesmo olhar sábio e amistoso.  

Silas Macedo

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

PET ROAD

Foto: Silas Macedo
Durante um final de semana de descanso no litoral Sul de São Paulo me deparei com Thiago, um simpático gato que vive em um recanto escondido ao pé da serra do mar. Vida mansa, comida, carinho é tudo que ele tem. 

O modelo-gato foi adotado por duas amigas que gerenciam uma lanchonete com clima amistoso e intimista chamado "Castelinho Prainha" em Peruíbe.

Quem passar por lá, indico conhecer o lugar, e também dar um afago no felino. 

Silas Macedo

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Lá vai a maluca

Lá vai a maluca! Quem nunca olhou uma pessoa caminhando pela rua ou mesmo parada, falando ou  rindo sozinha? O que pensar quando nos deparamos com alguém gargalhando sem um motivo lógico aparente? 

Em geral, o primeiro impulso é pensar que a pessoa tem alguns "parafusos soltos", "está fora da casinha", "alucicrazy", ou como preferir denominar o maluco. Olhamos, identificamos, e seguimos a rotina diária sem ao menos questionar os possíveis motivos para o riso frouxo. 

Agora invertamos as posições, imagine você com uma vontade incontrolável de rir ao lembrar de uma fato inusitado, a cena de um filme predileto, uma piada, uma reunião de amigos, um beijo, uma noite prazerosa de sexo, ou qualquer coisa que lhe faça bem.

O que fazer diante da vontade de rir? Segurar, reprimir, ou melhor, deixar os músculos da face relaxarem até formar um frondoso sorriso, seguido de uma sonora gargalhada. Acredito que a segunda opção é, sem dúvida, a melhor.

Estudos da medicina oriental e ocidental afirmam consensualmente que o riso proporciona uma carga de endorfina e serotonina  - hormônios do prazer - no corpo, aumento da corrente sanguínea, redução os níveis de estresse, e melhora do sistema imunológico. Além de trabalhar os músculos do abdômen, costas e pernas durante um ataque de riso.

Essa reflexão teve início após um acesso de riso com um amigo-irmão. Estávamos viajando, eu ao volante e ele ao meu lado, falando amenidades, até que abordamos essas situações que prender o riso é um crime. Esse amigo me contou  que diversas vezes tem crises homéricas de riso quando está caminhando pela rua. Ele disse que relembra momentos especiais e engraçados, dos quais muitas vezes vivemos juntos, e, sem perceber, logo está gargalhando.

 Ao perceber que está sendo observado, ele coloca os fones no ouvido do celular e simula estar ouvindo um programa de rádio qualquer. "Assim passo batido e não como maluco", disse ele. Depois ele disse que certamente as pessoas ao vê-lo afirmavam "lá vai a maluca". Quando percebemos, estávamos rindo compulsivamente. Bastava nos olharmos ou dizer "lá vai a maluca", que o riso surgia. 

Ao final, senti extremo conforto, relaxamento e satisfação. E questionei há quanto tempo não tinha uma crise de risos como aquela. Se faz tão bem, por que não as tinha com frequência, deixando a rotina, estresse e aborrecimentos tomar conta a vida. Penso que é necessário se permitir vivências como esta que relatei, quando sentirmos a vontade de uma risada ebulir.

O riso é saudável e, comprovadamente, contagioso. 














Permita-se e seja feliz.

Silas Macedo

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

PET ROAD

Já faz algum tempo que não houveram postagens Pet Road no Palanque de Ideias. Decidi retomá-las após registrar a beleza do pavão batizado de Govinda.

O majestoso pássaro vive no Retiro Espiritual Tao Tien na cidade de Extrema, Minas Gerais. Seu nome vem da tradição zen budista.

Curioso foi saber, por meio do responsável pelo retiro, que Govinda exibiu por muito tempo sua esplendorosa calda durante o flerte com uma galinha que vivia no local. Após a morte da galinácea, ele recolheu suas penas. 

Coisas da natureza...

Silas Macedo

sábado, 5 de outubro de 2013

Menos fofoca e mais silêncio por favor

Hoje escrevo, em especial, para relatar minha indignação sobre as maledicências, falsidades e fofocas que insistem em fazer parte da humanidade. Realmente estou cansado de conviver com pessoas que perdem grande parte do tempo falando mal das outras, destacando os defeitos alheios - quando não inventados, ou ainda projetando frustrações sobre o alvo da maledicência com intuito de disfarçar e justificar suas incapacidades.

Em primeiro lugar, quem gosta de ouvir "seu nome" na boca dos outros? Quem gosta de ter sua vida exposta àqueles que não têm nenhuma ligação real contigo? Quem gosta de ter suas qualidades deturbadas ou defeitos exacerbados por fofoqueiros? 

Certamente, ninguém dá respostas positivas a essas perguntas. E basta um simples exercício empático, coloque-se no lugar do outro e pense como ele se sentirá diante de palavras vãs e maldosas. E ainda, quando não formos os emissores da fofoca, mas apenas transmissores, devemos nos questionar se a informação é realmente verdadeira, se existe real necessidade de propaga-la, e qual o efeito disso sobre a vida do próximo.

E não justifiquemos nossos pequenos hábitos de maledicência afirmando que fofoquinhas não fazem mal. Porque fazem sim! Como um vírus, sem perceber, o que era um simples comentário se torna uma alarido infernal e, o que era uma ato inofensivo se torna hábito de falar mal dos outros. Diante disso, creio que devemos nos vigiar para não fazer das fofocas um hábito comum. E se insistirmos no erro, como tudo o que está na mesma vibração permanece junto, logo estaremos cercados por especuladores desocupados, vulgo fofoqueiros.

Vejo que nós humanos ainda temos muito a aprender. Lições de pessoas despertas como Platão ainda não foram assimiladas e colocas em prática. "Pessoas normais falam sobre coisas, pessoas inteligentes falam sobre ideias, pessoas mesquinhas falam sobre pessoas" - afirmou o pensador.

E creio que posso incluir no mesmo grupo de comportamentos e pessoas que devem ser evitados, os que invejam e reclamam o tempo todo. Quem aguenta conviver com pessoas de energia tão pesada e nefasta? Sem dúvida, apenas os que vivem na mesma vibração e se deleitam com o lodo que escorre do sofrimento alheio.

Penso que é necessário calar esses futriqueiros não dando atenção, ouvidos e audiência a eles. Mas como sempre haverá algum desavisado pronto para ouvi-lós, devemos nos policiar e nos afastar desse tipo de gente. Mudemos nossa vibração e pensamento, isso ajudará a mandar para longe os causadores de intriga.

E se for necessário, grite: Shiuuuuu!

Aconselho que todos fiquemos atentos para não nos tornarmos fofoqueiros de plantão praticando um exercício simples. Questionado a real necessidade daquela informação - boato - e, principalmente, revertendo o tempo e a energia gasta na fofoca em algo útil para o próximo. E se a dúvida do que fazer permanecer, vá lavar um tanque de roupa, trabalho voluntário, ou apenas o exercício do silêncio.

Silas Macedo

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Estiagem Textual

Nunca achei que eu pudesse entrar em processo de estiagem textual ou criativa - momento em que jornalistas, escritores, poetas e artistas simplesmente não conseguem escrever, se expressar ou criar. Já tive momentos diante do computador, na Redação - por exemplo, em que não conseguia escrever uma linha sequer. Mas, bastava respirar fundo, retomar o foco, e o texto simplesmente fluía junto do dedilhar no teclado.

Já ouvi relatos e tomei conhecimento dessa tal estiagem criativa, crise artística, ou qualquer outro nome. Fato, sorrateiramente, fui surpreendido por ela, e logo me vi incapaz de escrever. Expressar em palavras tudo o que vejo e sinto, seja para protestar, contar, desabafar, ou ressaltar a beleza da vida.

Diante da tela branca, me senti desnorteado. O que teria acontecido? A fonte teria secado? Que força ou motivos seriam capazes de me impossibilitar de escrever e calar a voz que ecoava dentro do meu peito?

Sem respostas, resolvi me recolher, mergulhar em mim, em um infinito de possibilidades. Páginas brancas versus um turbilhão de sentimentos, ideias, cores, mudanças e sensações mescladas em um grande furacão.

Tempo ao tempo... 

Ao entender os desígnios e recordar a importância da paciência e do tempo, esperei, confiante que após a tempestade pudesse ver os raios do sol. Sem pressa, me permitindo contemplar cada momento, retirando o melhor e tornando eterno o que aparentemente é efêmero.

Percebi que os sentimentos e ideias estavam em mim, vivos como antes, emitindo sinais diante de todos os estímulos que a vida me concede. E, gradativamente, como a água aprisionada em uma barreira que acha uma fresta para começar a fluir e logo romper os obstáculos, me vi diante do computador escrevendo novamente. Pronto para compartilhar experiências e o universo que existe em mim. E, sem dúvida, ansioso para também poder conhecer outros infinitos particulares.

Creio que compreendi, de forma empírica, a estiagem que outros passaram. E, principalmente, que entender a sabedoria do tempo nos permite não sofrer por ansiedade - sentimento que nos impede de discernir com clareza e viver de forma plena.

Por fim, afirmo que é necessário ter a paciência, a força e a sabedoria daqueles que vivem em locais onde a estiagem é companheira diária. Tendo a certeza que a chuva e a água sempre vem para nos abençoar. 

Basta confiar para não sofrer.

E como digo: Let flow!

Silas Macedo

domingo, 9 de junho de 2013

Estranha Normalidade

Esses dias tenho refletido sobre o que as pessoas consideram normal. Nos últimos meses tenho conhecido pessoas de diversas parte do País e do mundo, e diante de cada uma delas tenho colocado em prática o que tenho como verdade - trate o próximo como deseja ser tratado. Sorrindo sempre, sendo educado, gentil e com presteza fazer sempre o melhor para o próximo, seja alguém que nunca mais verei em minha vida ou um amigo íntimo.

O que me tem causado estranheza é o fato das pessoas não acharem isso normal. Em geral ficam surpresas, outras chegam a assustar, algumas ficam irritadas, e grande parte retribuem com sorrisos. Porém, o que tenho questionado é a tal "normalidade". 

Afinal o que é normal?

Ser grosseiro, desdenhar e faltar o respeito com o próximo, querer sempre tirar proveito das pessoas e situações, ser violento, voltar a barbárie colocando em prática máximas como a "dente por dente e olho por olho", trair, ser falso, mentir, roubar, entre as milhares de coisas que não sei porque a humanidade passou a considerar normal.

Outro dia ouvi: "Acorde! Deixe de viver em mundo de fantasia. As pessoas são cruéis e o mundo não tem mais lugar para gentileza." Sinceramente acho lamentável esse tipo de pensamento. Tenho consciência que o mundo está repleto de pessoas com má índole e que acham essa realidade normal, mas me nego a compactuar com isso, passando a viver dessa forma. Acredito podemos gradativamente mudar esse pensamento e postura diante da vida.

Pode parecer utópico, e realmente é uma utopia mudar o mundo e as pessoas da noite para o dia. O que afirmo é que podemos mudar aos poucos, ganhando um a um, semeando o bem no próximo por meio do exercício do bem, como um efeito dominó. 

Por vezes, bate um cansaço diante da tal "normalidade", chego a pensar se não seria mais fácil fazer parte da turba que vive a plenitude do egoísmo, barbárie e falta de amor. Mas receber sorrisos refletidos é algo com um valor que não pode ser mensurado. Exemplo disso, após trocas de sorrisos em um papo descontraído com um idosa, receber um abraço e ouvir "é bom encontrar com pessoas como você nesse mundo seco", sem dúvida, me dá a certeza que estou no caminho certo.

Sigo feliz a espera que mais pessoas se tornem "anormais".

Silas Macedo


domingo, 21 de abril de 2013

Carta Filosofal

Esses dias fui surpreendido ao receber uma carta de alguém que chegou há pouco tempo em minha vida. Sem dúvida, uma pessoa observadora e sensível, ao ponto de ver além do superficial. 

Em meio a correria cotidiana, recebi a folha que me descrevia de forma clara e surpreendente. Li o texto em meio a pessoas simples de coração, recolhidas abaixo de um mundo de superficialidades e deslumbres. Uma delas, ao ver minha reação após ler a carta, disse: "Bom ler palavras que fazem bem a alma né" - seguida de uma gargalhada.

O escrito, ao qual nomeei "Carta Filosofal" - fazendo referência a pedra filosofal dos alquimistas que transformavam pedra em ouro, diz por si só.

Eis o texto...

" Em um dia como tantos outros o encontrei, de primeira impressão o achei simpático, depois lírico demais, confesso que me assustei com tanta afinidade e pensei em recuar a confiança que roubaria de mim. Mas de forma natural as brumas se esvaneceram, revelando traços do leão. O fogo são seus impulsos. Um mestre das palavras, encantador de alma e ainda mais de coração. Silas um garoto carente. Um militante racional, uma criatura maravilhosa que não vai envelhecer nunca. Poderia figurá-lo em um vampiro pela inteligência, sabedoria e beleza congelada e nebulosa de mistérios, ou então o andarilho transmutável e até o oráculo de runas, mas acho que lhe cabe, por toda sua experiência e insistência de estudar a vida e atenção aos sinais que a vida nos dá, o alquimista."

Diante de palavras como essas ficam apenas o silêncio e a sensibilidade.

Silas Macedo

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Medo

Medo...

Medo de morrer, viver, arriscar, falar, machucar, magoar, pensar, ousar para ser feliz.

Sempre medo.

A humanidade sabe que o medo é uma ferramenta animal, um mecanismo de defesa do cérebro para evitar dor, garantir a sobrevivência e a continuidade da espécie. Fato, um condição necessária para que pudéssemos chegar até aqui. Porém, o problema surge quando o medo passa a ser uma âncora como já afirmava Lenine em uma de suas canções.

O que fazer quando o medo atormenta, nos deixa irracionais, nos fazem agir com impulsos tolos, equivocados e quase animais? Como vencer o medo quando a felicidade está em jogo?

A vida é sábia é nos tira da zona de conforto, seja no amor ou na dor. Recentemente fui vítima do medo, e percebi que ele me aprisionou, me fez agir de forma irracional, e principalmente me afastou de mim. Fazendo que eu agisse de forma oposta do que acredito e defendo na vida.

Após algumas reflexões, percebi que o medo é uma grande problema nas relações humanas, quando recuamos por medo sempre diante de algo que nos incomoda ou nos impede de ser plenamente feliz. Medo de perguntar, falar, ouvir, arriscar, romper, e magoar o outro. Entendi que em uma vida plena não há espaço para o medo. 

A vida é tão intensa e preciosa, nos chamando sempre a conhecer e vivenciar novos horizontes, que definitivamente não podemos ficar âncorados no medo. Me lembrei de uma frase da personagem Blanche Dubois, da peça "O Bonde Chamado Desejo", de Tennessee Willians, que diz "O oposto da morte é o desejo". De forma paralela, o desejo de viver e romper com o medo representa o impulso rumo a felicidade. Uma verdade que relembrei hoje.

Ainda me recordei da máxima que afirma que só é feliz, rico e amado, aqueles que arriscam pesado, sem medo. Por vezes, o medo nos acua e faz com que esqueçamos de quem somos e o que acreditamos, e nesta hora é necessário nos encontrarmos e seguir rumo a felicidade.

A vida, sempre sábia e paciente, nos conduz para que tudo aconteça da melhor forma. Hoje me recordei que há algum tempo arrisquei rumo a novos horizontes, arrisquei ao jogar para o alto um emprego estável para fazer o que amava, arrisquei para encontrar meu grande amor em um xeque-mate, e sou feliz devido a isso.

Hoje a vida me mostrou que não há tempo e espaço para medo, inseguranças e todos os fantasmas que insistem em assombrar. Percebi que só há uma coisa a fazer, arriscar e pular de braços abertos no aparente abismo, mas seguro que levará a felicidade plena.

Eu pulo e arrisco sem titubear. Não a tempo a perder. Âncoras recolhidas para seguir aos novos horizontes.

Silas Macedo

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Palavra Incógnita

O verbo, tudo começa com ele. A palavra. A ordem divina para o início de todas as coisas...

Ela desde os primórdios dos tempos exerceu um papel importantíssimo para a evolução gradativa da humanidade, permitindo que culturas fossem perpetuadas, conhecimentos passados de geração em geração, reinos erguidos, ou dizimados,  tratados de guerra e paz estabelecidos, mostrando assim o seu poder.

A palavra rompeu limites por meio da notícia, impressa em páginas de papel ou reproduzida pelos quatro cantos do mundo em telas repletas de códigos binários. A importância da palavra é inquestionável, porém a questão é como usá-la, como fazer com que ela abra portas, traga respostas, e chegue aos ouvidos do próximo sem nenhuma distorção ou má interpretação.

Já diziam os antigos, a palavra pode ser bálsamo ou extremamente dolorosa. Como fazer com que o outro não interprete mal o verbo lançado? Como garantir que as palavras sejam como brisa leve? Como ser ético e fiel a verdade e a transmissão da informação.

Sem dúvida, um desafio para aqueles que trabalham com a palavra, mas principalmente para todos que se comunicam e estabelecem relações, desde uma simples orientação de como chegar a algum lugar, reportar um fato, relacionar-se com colegas de trabalhos, familiares, amigos e quem amamos e decidimos passar o resto de nossas vidas.

Diante disso, tenho refletido, após algumas experiências pessoais, que a palavra correta é por vezes uma incógnita, ou melhor desnecessária. Aplicando o conceito de mestres antigos, filósofos, pensadores e poetas, como o de Clarice Lispector - "Viver ultrapassa qualquer entendimento". Sinalizando que, por vezes, devemos deixar de lado a necessidade de entender ou explicar tudo. Aquietando o coração e os pensamentos sem verborragia, permitindo que a verdade venha a tona sem pressa.

Lembrei ainda de um trecho de uma crônica que dizia que o silêncio entre duas ou mais pessoas não representa a falta de diálogo, mas a perfeita sintonia. Respeitar o silêncio do outro e entender em um simples gesto ou olhar tudo o que é necessário. O que faz ter certeza que a palavra é, por vezes, desnecessária.

Fazendo o uso das palavras de uma tia e amiga querida - "Eu sei, mas não sei conceituar" - termino a minha reflexão constatando que há um subtexto repleto de palavras intrínsecas no silêncio que remetem a harmonia e paz.

Silas Macedo

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Desejo Senil

Quero encontrar a velhice sem medo...

Diante das rugas e sinais do tempo
Que venha a permanência de um sorriso leve
E que as marcas do tempo em meu rosto sirvam de mapa para os mais jovens

Desejo ter palavras doces, severas e sábias
A quem necessite delas
Poder despejar elogios ao próximo
Sem medo 

Quero ter passos lentos
Sem pressa de chegar
E poder aproveitar o melhor da vida
Cada paisagem, gosto e pessoa

Almejo poder vislumbrar um por do sol
Com o saudosismo da velhice
O olhar novo de uma criança
E a sabedoria de quem viveu a vida bem vivida

Anseio pela serenidade
Para resolver problemas com simplicidade
Discernimento para separar o joio do trigo
E preparo para lidar com o que ainda não conheço

Quero trazer em mim
Paciência, sabedoria, amor
E apenas sorrisos em uma alma leve

Que venha a velhice.

Silas Macedo