terça-feira, 6 de maio de 2014

Boato,informação e barbárie

Nesta última segunda-feira (5) o espancamento de uma mulher ganhou destaque nos principais periódicos e telejornais do País. A dona de casa Fabiane Maria de Jesus, 33 anos, morreu na manhã desta segunda após ter sido espancada por dezenas de moradores do Guarujá, no litoral de São Paulo, agredida a partir de um boato lançado em uma rede social que afirmava que uma mulher, com supostamente as mesmas características físicas que ela, sequestrava crianças para sacrificá-las em rituais de magia negra.

Ao ler as notícias e assistir as reportagens fiquei estarrecido diante de tanta barbárie. A primeira coisa que pensei foi que voltamos ao tempo das cavernas, perdemos o intelecto e deixamos a animosidade tomar conta de nós. A cena da mulher arrastada por homens, outras mulheres, e ainda crianças, espancada, sangrando, levada como um troféu em meio a risos, e gritos é realmente assustador.

O caso está senso investigado, o site que lançou a informação de forma irresponsável na rede negou os fatos, e se posicionou dizendo que não vai se manifestar com o intuito de não atrapalhar as investigações. Diante disso, inevitável não pensar sobre o processo de evolução ou retrocesso de alguns seres humanos.

O primeiro ponto a ser refletido é sobre a veracidade da informação e, principalmente, a responsabilidade em transmiti-lá. Quanto a imprensa vale lembrar o caso clássico da Escola Base - cujo a vida dos diretores da escola infantil foi destruída após terem sido acusados de abusar das crianças dentro da instituição, o que era falso - que remete os comunicadores sobre a responsabilidade de transmitir uma informação. 

E quanto aqueles que não trabalham com comunicação? Qual a responsabilidade de cada pessoa ao passar uma informação adiante? Será que pensamos e agimos da forma correta ao passar um boato ou notícia adiante? Questionamos a veracidade do fato? E ainda se isso vai ajudar ou prejudicar alguém? Penso que muitos problemas seriam evitados com uma mudança de postura simples, inclusive poupado a vida de Fabiane.

O segundo ponto é sobre a barbárie. Como que direito e baseado em que os agressores desta mãe acharam que poderiam agredi-la até a morte, ainda que ela fosse a tal sequestradora de crianças? Os crimes foram confirmados? Quais as provas? Não é necessário o trabalho de investigação da polícia e a interseção da Justiça? Veredito popular foi o fator decisivo para matar esta mulher de forma tão cruel?

E penso ainda sobre esses homens e mulheres, pais e mães, acompanhado por crianças, filhos ou não, como testemunhas oculares da morte com violência para punir uma "criminosa". Que referência de respeito ao próximo essas crianças terão após terem uma lição como esta? Qual o nível de consciência dessas pessoas? Creio que nenhum, apenas animosidade.

Acredito que muitos dos agressores não queriam apenas "justiça", mas também exteriorizar suas insatisfações diante da vida, frustrações e, acima de tudo, seu ódio e violência, escondidos em comportamentos e sorrisos de pseudo-normalidade. Fatos como este, estão perto de nós, camuflados e esquecidos na rotina e negligência. Há duas semanas, ouvi o relato sobre um homem que foi amarrado em um poste, em pleno meio dia, na Avenida Humberto de Alencar Castelo Branco, em Guarulhos, para apanhar dos moradores do local, após ter sido apanhado tentando roubar um mercadinho do bairro - fato não comprovado.

Espero que este texto nos ajude a refletir sobre como receber uma informação, notícia, boato ou fofoca, e questionar a veracidade e o peso dela, e se devemos repercuti-la. E principalmente, sobre nosso posicionamento diante da vida, e o que cultivamos em nós e no próximo. Violência e ódio ou amor e compreensão? E , quase como uma utopia, espero que notícias como essas não voltem a ser veiculadas porque simplesmente não acontecem mais.


Silas Macedo